quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Ciclo Claudio Santoro na Sala Cecília Meireles

Um pouco em cima da hora, mais ainda em tempo, essa postagem não veio apenas para divulgar o evento que ocorre nesta semana na Sala Cecília Meireles, mas para falar um pouco do homenageado. Nas outras divulgações que fiz, meus comentários sobre os autores tentaram contextualizá-los na época em que viveram e nas condições históricas em que se encontravam - de forma muito ligeira e superficial, reconheço, mas justificável pelo objetivo e pela ocasião em que as mensagem foram enviadas - e não pude aprofundar muito nenhuma particularidade do grupo ou artista em especial. Isto não será diferente aqui neste post, mas, como por acaso o compositor em questão é também meu avô materno, talvez eu consiga contribuir com alguma informação curiosa que, mesmo remotamente, possa acrescentar algo a este universo.
Não quero publicar uma biografia de Claudio Santoro aqui. É melhor visitar o site disponibilizado neste blog na coluna à direita na seção de links onde se pode ter acesso a muitas outras informações e até a muita bibliografia. Mas para que os mais interessados que estão lendo este blog não fujam diretamente ao link, resumirei que Claudio Santoro nasceu em Manaus, foi educado para ser violinista virtuose desde muito criança, descobriu a composição na juventude, foi atonal, dodecafônico, e, seguindo a orientação do partido comunista da URSS, tonalizou sua música para se aproximar mais do gosto do "povo" - o que é uma expectativa absolutamente longe do razoável no Brasil, visto que a nossa "massa" era e é completamente diferente da "massa" na Europa - e acabou por realizar suas últimas obras em uma linguagem bastante autêntica e romântica. Como comunista, foi perseguido na ditadura, teve negado o visto para receber um prêmio nos EUA e foi convidado muitas vezes pela URSS para concertos, homenagens, etc. Morou bom tempo na Alemanha e morreu em Brasília, regendo em um ensaio em 1989, onde viveu seus últimos anos e onde havia fundado a Orquestra do Teatro Nacional.

O que muito me recordo, durante suas longas estadias no nosso apartamento, era a força com que defendia a sua própria música da mediocridade alheia - ele muitas vezes tinha que brigar com alguém no telefone, e eu escutava muito as suas conversas. Apesar de sua grande simplicidade, meu avô não tinha a tola humildade comum à boa parte dos artistas no Brasil e sabia da importância do que fazia e da grandiosidade que possuía o conjunto de sua obra até então escrita. Apesar do seu imenso orgulho de ser um músico brasileiro, tinha uma grande amargura com relação à aridez cultural em que o país vivia.
Entretanto, não encarava o seu trabalho como uma arte dos deuses. Muito pelo contrário. Esta certeza com relação ao próprio ofício era o mesmo orgulho que um bom sapateiro tem do seu trabalho bem feito. Ele entendia que compor não é mais nobre que o trabalho de um serralheiro ou um engenheiro. É apenas outro ofício, e pode ser feito com a mesma seriedade que qualquer serviço.
E eu acredito que é o que faz muita falta aqui no Brasil, onde a arte é muitas vezes encarada - e é este o ponto - como uma breve curtição, o que é um sintoma do nosso atraso. É o erro de só se buscar o prazer fácil, que é o prazer pequenininho e raso, a ejaculação precoce.
Como gostava de desafios, apesar da vida muito confortável que tinha na Alemanha e o maior reconhecimento acadêmico e artístico do qual usufruía no seu meio, quando foi convidado a voltar ao Brasil para fundar a Orquestra do Teatro Nacional (precisou se exilar na ditadura), não hesitou. Voltou com a certeza de estar ajudando na construção da cultura daqui, e de poder, na terra em que nasceu, continuar fazendo o seu trabalho bem feito.

4 comentários:

  1. Gostei muito do texto Luís, parabéns. Seu avô foi importante para o Brasil e é bem bacana que vc, como neto, ajude a manter essa memória viva.
    Um beijo,
    Moema

    ResponderExcluir
  2. Ave Barba!
    Muito bom o texto. Gostaria muito de assistir ao concerto sinfônico com a OSB. Você vai?

    Un abbraccione,
    Bruno.

    ResponderExcluir
  3. Luis
    Como vc escreveu bem gosto muito de ver o seu blog, suas seleções, seus comentários principalmente o ultimo que fala de Claudio santoro. Essa parte musical e pessoal só poderia ser feita por quem conviveu com ele. Esses comentários é que fazem do BLOG essa interface tão democrática e aberta deveríamos utilizá-la mais.
    Abraços e parabéns pelos comentários.
    Sugestões colocar musicas e videos do Santoro .

    ResponderExcluir