terça-feira, 21 de julho de 2009

Bruno Migliari e banda no Cinemathèque (29/7)

Quero aproveitar para "re-divulgar" o show de Bruno Migliari no Cinemathèque, no dia 29 de julho de 2009, através do site do psicólogo Henrique Pereira. O site do Henrique pode ser acessado diretamente clicando aqui.

Bruno Migliari e banda no Cinemathèque (29/7)



Hoje é "o dia do amigo". Data mais que propícia para falar de um "amigo fundamental" (a expressão é de Nelson Rodrigues): Bruno Migliari. Não bastasse Bruno ser meu soul-brother, é também um virtuose do baixo elétrico e acústico; certamente um dos maiores musicistas do Brasil em seu instrumento. Passeia com o mesmo brilho por estilos musicais diversos, como o jazz, o samba, o rock e o tango.

Há muito tempo, num passado remoto envolto de névoas espessas, eu e Bruno compartilhamos, em períodos diferentes, uma mesma banda de rock: o "legendário" Leprechaun. Quiseram os deuses que, diante de certa encruzilhada, eu tomasse a perigosa estrada da psicologia e Bruno perseverasse pela não menos acidentada via da música. Isto não impediu, porém, que nossos caminhos continuem se cruzando pela vida afora, em nossas respectivas casas, nas ruas de Laranjeiras, nos cafés, restaurantes etc. Tínhamos — e ainda temos — uma estranha paixão em comum: a figura algo extemporânea de Ian Anderson e sua banda, o Jethro Tull.

Anotem na agenda: Bruno Migliari vai tocar com sua banda quarta-feira (29/7), no Cinemathèque (Rio de Janeiro), no formato de umpower trio com saxofones. Encontro você lá!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Sexo Gratis e Fácil

Eu queria aproveitar o título desta postagem para divulgar mais uma vez a primeira série do ciclo "Contrapontos Vienenses", que se inicia hoje na Sala Cecília Meireles. O diretor da sala João Guilherme Ripper disse que ainda existem muitos ingressos disponíveis. No programa, serão apresentadas obras de três compositores que fazem parte com mais frequência dos repertórios das salas de concerto (Brahms, Schubert e Beethoven) intercaladas com obras dos compositores da Segunda Escola de Viena (Schoenberg, Berg e Webern), cujo repertório provavelmente tem, entre as peças a serem interpretadas, algumas ainda inéditas no Brasil. Esta primeira série do ciclo foi dividida em: Quinta-Feira - recital; Sexta-Feira - quartetos de cordas; Sábado - orquestra.

A Sonata Opus 1 de Alban Berg não é uma obra do período dodecafônico, nem é típica da forma clássica com três ou quatro movimentos. Consiste em um único movimento em Si menor, fazendo uso frequente do cromatismo, vagando por diversas tonalidades, dando uma grande sensação de instabilidade. Nas Três Peças Para Piano de Schoenberg, composta em 1909, a harmonia tradicional é completamente abandonada pela primeira vez, representando uma grande revolução musical. Já Variações para Piano Opus 27 de Webern, é uma obra essencialmente dodecafônica, e representa um complexo e engenhoso trabalho de "geometria" serial.

Abaixo está disponibilizada a Sonata Opus 1 de Alban Berg, interpretada por Glenn Gould no piano. A primeira peça você pode ver na minha postagem do dia 28 de junho, também com Glenn Gould (Variações de Webern - Opus 27). Da terceira obra, as Três Peças para Piano de Schoenberg, só consegui o primeiro movimento, que também está abaixo, com partitura.



A programação:

Quinta-Feira, 16 de julho 2009 às 20:00h

Paulo Gori, piano.

Programa

Webern - Variações Op. 27.

Alban Berg - Sonata Op. 1.

Schoenberg - Três peças para piano Op. 11.

Brahms - Intermezzi Op. 117.


Sexta-Feira, 17 de julho 2009 às 20:00h

Quarteto de Cordas Raga ( Adonhiran Reis, violino. Alceu Reis, violoncelo. Gabriel Marin, viola. Ricardo Amado, violino. ).

Gabriella Pace, soprano.

Programa

Schubert - Quartettzats.

Schoenberg - Quarteto Op. 10.

Beethoven - Quarteto Op. 130.


Sábado, 18 de julho 2009 às 17:00h

Orquestra Sinfônica Brasileira .

Daniel Guedes, violino. Laurent Campellone, regente.

Programa

Webern - Seis peças para orquestra.

Alban Berg - Concerto para violino.

Brahms - Sinfonia N. 4.


R$ 1 (estudante da rede oficial de ensino de música). R$ 10 (pl. sup.).: R$ 20 (pl.) Há meia-entrada para estudantes e idosos.

Largo da Lapa - 47 - Centro - Rio de Janeiro - RJ - 20021190 - 21-2332-9176 - ramal 21

domingo, 12 de julho de 2009

O sistema tonal 1


Para os dias 16, 17 e 18 de julho a Sala Cecília Meireles organizou o ciclo vienense, com a execução de obras de compositores que residiam em Viena em dois períodos diferentes e igualmente importantes. Obras de Brahms, Schubert e Beethoven serão apresentadas intercaladamente a obras de Schoenberg, Berg e Webern. Os primeiros são representantes do auge do sistema tonal, enquanto os últimos promoveram sua ruptura e criaram uma nova linguagem, o dodecafonismo.

O objetivo do ciclo é contrapor as duas linguagens e ao mesmo tempo ressaltar alguma possível continuidade. Mas para entender o que significa essa ruptura, é preciso compreender o que é essa música tonal cuja preponderância perdurou por quase quatro séculos.

A escala que a música ocidental moderna utiliza tem origem no engendramento da série harmônica, que nada mais é que um fenômeno acústico da natureza. Uma corda vibrando em certa frequência ressoa também outras frequências que são seus múltiplos. Dividindo esta mesma corda no meio, ou em 3 partes, ou em 4 partes, e etc., obtem-se também esta série de freqüências, que chamamos de série harmônica. Os harmônicos seguem a seguinte ordem, a partir de uma nota inicial arbitrada (começamos por dó):

dó (uma oitava acima) – sol – dó (duas oitavas acima) – mi – sol (uma oitava acima do primeiro sol) – etc.


Em outras culturas, as diversas escalas e suas subdivisões também foram originadas pela observação deste fenômeno, diferenciando-se no desenvolvimento, seguindo cada povo a sua cosmogonia, a sua tecnologia e outros traços de cada sociedade. Em muitas civilizações diferentes, na áfrica, América ou Ásia, quase totalmente isoladas por terra ou por mar, certa escala primeira, a escala pentatônica, originada a partir do encadeamento das quintas (o segundo harmônico) está presente. Se, por exemplo, tomarmos fá como nota inicial, o segundo harmônico será dó. A quinta de dó é sol. A quinta de sol é ré e de ré é lá. Assim, temos fá, dó, sol, ré e lá. Sequenciando o resultado temos:

fá – sol – lá – dó – ré.

Percorrendo esta escala no piano podemos recordar certo sotaque oriental, de música chinesa, e, dependendo do timbre, ritmo, instrumentos, etc., ele pode nos remeter à música da áfrica subsaariana ou até mesmo ao Blues. E a escala permite um encadeamento livre, a partir de qualquer nota, em uma circularidade fácil e natural.

A escala diatônica, célula básica da música ocidental, também surge a partir desta associação de quintas, chegando ao nosso familiar dó-ré-mi-fá-sol-lá-si. Como a relação intervalar da escala é desigual, a partir do estabelecimento de qual nota é a nota inicial (tônica) pode-se obter sequências com coloridos diferentes, os modos, que eram usados conforme se intencionava conferir um aspecto sonoro particular para cada peça. É a chamada música modal. Durante a Idade Média os modos utilizados foram estes:

Intervalos

1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom: Jônio

1 tom - ½ tom - 1 tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom: Dórico

½ tom - 1 tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom -1 tom: Frígio

1 tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom: Lídio

1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom: Mixolídio

1 tom - ½ tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom - 1 tom: Eólio

½ tom - 1 tom - 1 tom - ½ tom - 1 tom - 1 tom - 1 tom: Lócrio

Exemplos

dó - ré - mi - fá - sol - lá - si: Jônio

ré - mi - fá - sol - lá - si - dó: Dórico

mi - fá - sol - lá - si - dó - ré: Frígio

fá - sol - lá - si - dó - ré - mi: Lídio

sol - lá - si - dó - ré - mi - fá: Mixolídio

lá - si - dó - ré - mi - fá - sol: Eólio

si - dó - ré - mi - fá - sol - lá: Lócrio

Mas as duas notas adicionais da escala diatônica nos trazem novos problemas, que a escala pentatônica não possui. Primeiramente, ela cria dois intervalos de meio tom, mi/fá e si/dó. Experimente tocar estas notas ao mesmo tempo e ouça a dissonância. Segundo: ela estabelece a existência do trítono, que é o intervalo de três tons inteiros, como o de fá e si. Há uma dissonância mais forte que entre mi/fá e si/dó. Este intervalo foi chamado durante a Idade Média de "diabolus in musica". Enquanto as notas da escala pentatônica podem se relacionar e trabalhar em conjunto sem maiores problemas entre si, pois não possuem o trítono nas suas relações intervalares, na escala diatônica temos dissonâncias que tornam complexa esta relação, demandando maior cuidado e regras mais rígidas nos encadeamentos melódicos e na harmonia.

Enquanto os músicos antigos que utilizam a escala diatônica, desde os gregos, passando pelo papa Gregório e até a Baixa Idade Média, produzem suas composições através do uso dos modos escalares evitando o trítono, não existe conflito. A partir do século XV, com a multiplicação das obras polifônicas, estas relações verticais começam a demandar o estabelecimento de pactos que vão culminar na criação da linguagem tonal. E embora os monges católicos tenham evitado o trítono com o diabo foge da cruz (ou melhor, ao contrário), ele é na verdade o motor de todo o desenvolvimento do sistema tonal e da música ocidental a partir do século XV.

sábado, 11 de julho de 2009

Interpretação 2


O vídeo acima é um dos vídeos mais assistidos no YouTube dentro de seu segmento. Esta gravação, realizada com o grande pianista ucraniano Vladimir Samoylovych Horowitz (se tornou cidadão americano em 1944 e faleceu em NY-EUA), é uma jóia, pela música e pela interpretação. A obra é um arranjo do compositor Ferruccio Busoni (Empoli 1866 - Berlim 1924) para o Chorale in G Minor de Bach. Busoni fez uma série de arranjos para outras peças de Bach, além de ter sido um grande compositor, e é considerado o precursor do neoclassicismo.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

John Cage, ou...

John Cage era um micologista. Também era filósofo, poeta, gravurista, escritor, colecionador de cogumelos e, contrariando a opinião de alguns, compositor.

Foi aluno de Schoenberg e Henry Cowell, percorreu a América com a Companhia de Dança de Merce Cunninham, e fez parte do grupo internacional e multidisciplinar de artistas "Fluxus" (pertenceram a esta rede George Maciunas, Yoko Ono e György Ligeti).
Segundo seu próprio mestre, Arnold Schoenberg, Cage não era um compositor, mas um gênio-inventor. Sem contradizer esta afirmação e como também estava em sintonia com sua época (nasceu em 1912 e morreu em 1992), Cage gostava de criar métodos: pela influência do Zen Budismo e o Taoísmo, concebeu uma forma de compor através do acaso dos resultados de um jogo de moedas e de um programa de computador com operações randômicas relacionadas ao I Ching; pela influência das novas tecnologias compôs uma peça que utilizava cinquenta e duas fitas com sons gerados por computador, sete cravos e a projeção de 6.400 fotos de desenhos fornecidos pela NASA, mostrados a partir de sessenta e quatro projetores de slides; utilizando o conceito do circo, elaborou a peça Musicircus, onde simultaneamente vários músicos - ou não músicos - se reúnem em um grande espaço e em diversas posições para, em períodos determinados ou não, tocar diferentes peças musicais, ou não (!!!).
Seus trabalhos variam entre o silêncio total de 4'33" - uma peça em que nenhum instrumento é tocado, em 3 movimentos - e belas composições como In a Landscape, onde uma melodia simples é interpretada com o pedal do piano abaixado, criando uma harmonia singela.
Mas a característica mais marcante de seus trabalhos é a sua defesa de um maior ou menor grau de indeterminação, seja na composição, seja na execução de suas obras. Para ele, o compositor é um "agenciador" de acasos sonoros.
Para perceber o efeito destes acasos na execução de sua música, é interessante ouvir a Sonata V para piano preparado, tocada por músicos diferentes em momentos diferentes e, "preparos" diferentes, e sentir o resultado. Nesta peça, o piano recebe antes um "preparo" especial, com parafusos, tiras de borracha e outros objetos entre suas cordas. A forma de preparo não é preestabelecida. Cada intérprete faz o seu, como melhor lhe parecer.


sexta-feira, 3 de julho de 2009

Charles Ives e a liberdade

Determinar marcos históricos é um dos esportes prediletos dos historiadores. O que é bastante natural, tendo em vista as complexidades e contradições dos fatos e a calma que sentimos com a simplificação das coisas.
Algumas obras marcam bem a passagem do romantismo para o modernismo, como “L'après-midi d'un faune” de Debussy e “Le Sacre du Printemps” de Stravinsky, mas todos sabem e entendem que as coisas acontecem muito mais gradualmente. Mesmo Beethoven e Mozart já haviam composto os seus quartetos dissonantes (Grosse Fugue e Quarteto K.465 respectivamente), prenunciando o que estava por vir um século depois. Seria ainda preciso passar por Brahms e Schubert e todo o romantismo, pelo cromatismo de Wagner e pela música de Mahler para chegarmos até Schoenberg.




Fora de Viena, no final do século XIX, em outro continente e sem que pudesse ter ouvido uma peça de Webern ou Stravinsky ou ter escutado com maior frequência qualquer música posterior a Schubert, Charles Ives já fazia a sua revolução particular em Nova York. Natural de New England e formado pela Universidade de Yale onde estudou composição, era filho de Georges Ives, que foi diretor de banda musical durante a guerra de Secessão. Seu pai, segundo dizia, transmitiu à ele que não existem regras na música, que está aberta às mais livres experimentações, com todos os sons disponíveis no mundo. Haviam algumas histórias interessantes sobre o pai: fez uma vez duas bandas marcharem uma contra a outra para ouvi-las em simultânea cacofonia. Ives também se recordava que ele e os irmãos foram instruídos a cantar a canção rural "Old Folks At Home" em mi bemol, enquanto o pai fazia o acompanhamento em dó.


Mas Ives precisaria ainda se formar, se mudar para Nova York e começar a trabalhar na Mutual Life Insurance Company, enquanto era também diretor musical na Central Presbyterian Church para, depois de um promissor início como compositor, desaparecer no cenário musical. Ninguém sabia muito a razão de ter feito isso, mas especulava-se que Ives possuía certo bloqueio em relação à cultura da música clássica americana. Parecia-lhe uma "arte emasculada", controlada por senhoras de caridade e estrangeiros efeminados. Ives acreditava que a música americana fora desvirtuada pelos seus compositores para agradar ao público, e era preciso compor com mais audácia, utilizando ritmos complexos, texturas complicadas e acordes dissonantes. Em um concerto onde seu amigo compositor Carl Ruggles era sistematicamente vaiado, Ives gritou: "Seus maricas, quando ouvirem uma música forte e máscula como esta, levantem-se e usem seus ouvidos como homens!"
Na verdade, suas concepções musicais eram mais profundas que isso. Ives era filho da terra de onde se originou o transcendentalismo. Acreditava no homem comum e na força de sua intuição como forma de progredir na arte e na vida. Sua música foi composta à noite e nos finais de semana, quando não estava dirigindo sua companhia de seguros. Mas foi criada com liberdade, longe da ofuscação dos teatros e das duras críticas da classe musical novaiorquina. Enquanto Schoenberg precisou conceber uma nova teoria musical, com regras e justificativas, seja em oposição ou continuidade à forte tradição tonal européia e vienense, Ives criou seu método de composição sem dar explicações a ninguém, utilizando a justaposição de diferentes texturas sonoras, de tonalidades e ritmos diferentes, de forma a completar um todo às vezes dissonante, outras vezes dotado de sonoridade popular e tipicamente americana. Era a mesma liberdade que deu origem ao jazz, à Duke Ellington e à harmonia experimental dos anos seguintes.

Uma boa oportunidade para conferir ao vivo a obra de Charles Ives é neste domingo às 17:00h, na Sala Cecília Meireles, quando o Emerson String Quartet tocará seu Quarteto nº 1.